Amor que adoece

Metamorfose - Edição #086

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É fácil admirar quem se doa por inteiro.

Parece afeto, cuidado, até amor.

Mas o que quase ninguém percebe é o custo dessa 'entrega total' é a desconexão com a própria vida.

Deixa metas de lado, ignora sentimentos, abandona a saúde, a espiritualidade, a carreira.

Afeto, quando não vem de um lugar saudável, a disponibilidade constante se torna um desaparecimento sutil.

Amor demais também adoece

Ela sempre estava lá. Quando ninguém aparecia, ela surgia. Fazia sopa, escutava desabafos, resolvia boletos. A amiga, a irmã, a filha perfeita. Todos diziam: “Ela é um anjo”.

Só que ninguém notou quando ela começou a dormir mal. Quando esqueceu de renovar o próprio remédio. Quando parou de escrever, de sonhar, de existir.

Primeiro, o cansaço. Depois, a ansiedade. E então, um vazio silencioso — nem as palavras dos outros preenchiam.

Você conhece alguém assim? Ou pior: será que esse alguém é você?

A promessa que esconde o preço

"O afeto mal resolvido vira cobrança disfarçada." — Bell Hooks

Ela parece perfeita. Disponível, carinhosa, sempre pronta para ouvir. Nunca reclama, nunca impõe limites. Um abraço ambulante.

Mas, com o tempo, algo começa a pesar. Você sai das conversas mais exausta do que entrou.

Sente-se em dívida, como se nunca fosse suficiente. Como se sua simples presença não bastasse, como se fosse preciso provar amor, lealdade e gratidão o tempo todo.

É sutil, mas corrosivo. Ela nunca pede abertamente. Mas cobra com silêncios longos, olhares magoados, respostas frias.

E então, você percebe: aquilo que parecia amor era carência. A atenção era moeda. O cuidado vinha com juros.

O que era doação vira dívida. O que era amor vira controle.

Tem gente que não ama — negocia. Te oferece o ombro, mas espera que você carregue a alma dela no bolso. Escuta você, mas espera ser ouvida em dobro. “Ajuda”, mas secretamente quer te manter por perto.

Esse tipo de afeto suga como um ralo invisível. Você se aproxima para beber, mas sai mais seco do que entrou.

Sempre disponível, nunca presente

"Você só conhece o outro até onde ele permite ser visto." — Carl Jung

Ela está sempre ali. Responde rápido, antecipa necessidades, organiza tudo. Resolve problemas antes mesmo de serem percebidos.

Mas algo não encaixa. Você convive, conversa, ri… e, mesmo assim, não a conhece. Parece que está ali — mas nunca inteira.

Ela escuta, mas não compartilha. Ajuda, mas não se abre. Se entrega, mas sem se revelar.

É como conversar com um espelho embaçado: você vê a silhueta, sente a presença, mas nunca enxerga com nitidez.

Essa doação constante, esse cuidado ininterrupto, é uma fuga. Uma forma sofisticada de não encarar a própria dor.

Ela se esconde na utilidade. Acha que, enquanto for essencial para os outros, ninguém vai perguntar como está. Ninguém vai notar que por dentro tudo está desabando.

Vive se doando porque tem medo de se encontrar. Tem medo do que pode ver se parar.

A vida deixada para trás

"Você pode dar tudo de si e, ainda assim, perder a si mesmo." — Brené Brown

Ela parou de escrever. Aquele livro que começou ficou no segundo capítulo. A aula de dança? Cancelada. O retiro? Adiado. O sono? Interrompido.

E sempre por uma causa nobre. Um parente doente. Um amigo em crise. Um namorado em colapso emocional.

Ela virou bombeira da vida alheia. E, como toda bombeira, vive cercada de fogo — menos o próprio.

Porque o fogo que queima por dentro, ela aprendeu a ignorar.

Seus próprios sonhos entram na fila. As vontades viram luxo. O silêncio vira culpa.

Ela acredita que ajudar é um chamado — mas esquece que também é um vício. Um modo de se anestesiar do que sente. De se proteger da dor de olhar para si.

E assim, a vida dela se torna um vácuo barulhento. Tudo acontece — menos o que importa.

E, quando ela para… quando o telefone finalmente silencia… só o que sobra é uma sensação amarga de que o tempo passou, e ela não viveu.

O que parecia altruísmo, era abandono de si. O que parecia presença, era ausência de propósito.

Ela deu tudo. Mas esqueceu de si. Agora, vive numa casa emocional onde todas as luzes estão acesas — mas ninguém mora lá.

A raiz emocional do vampirismo

Por trás da doação exagerada, há sempre um trauma não resolvido.

Uma ferida antiga, feita num tempo em que o amor era condicional.

Ela aprendeu que só seria amada se fosse útil. Se não desse trabalho. Se colocasse os outros sempre em primeiro lugar.

Então, virou boa. Boazinha até demais. Aquela que todos procuram, mas ninguém conhece. Que todos elogiam, mas ninguém escuta de verdade.

Ser necessária virou mecanismo de sobrevivência. Se parar de cuidar, teme desaparecer.

Ela não oferece amor — oferece utilidade. Não busca conexão — busca validação.

Cada gesto de afeto vem com um grito silencioso: “Não me abandone.” “Fique aqui.” “Me veja.”

Mas como pedir isso diretamente parece “egoísmo”, ela aprende a disfarçar o pedido. Cuida. Serve. Apaga incêndios. Faz tudo — para não precisar dizer o que sente.

No fundo, não está tentando ajudar você. Está tentando se salvar por meio de você.

Apega-se à sua dor porque não sabe o que fazer com a dela. Te escuta com atenção porque tem medo do silêncio dentro da própria cabeça.

E assim, cria vínculos baseados na dependência. Relações onde o amor parece cuidado — mas é prisão.

Amor não exige exaustão

"Amar o outro nunca deveria significar deixar de amar a si mesmo." — Rupi Kaur

Existe uma ideia distorcida de que amar é se doar até não sobrar nada. Mas amor de verdade não drena.

Relações saudáveis não exigem sacrifício constante de uma única parte. Não exigem que você se apague para o outro brilhar. Não colocam sua felicidade em segundo plano como prova de afeto.

O verdadeiro cuidado começa com o cuidado por si. Com a coragem de dizer “não”. Com a ousadia de se escolher primeiro — não por egoísmo, mas por sanidade.

É como no avião: sem a sua máscara, ninguém respira.

Você pode estar cansada de dar tudo. De tentar manter relações à força. De sempre carregar o peso emocional dos outros como se fosse sua única forma de ser amada.

Mas há outro caminho. Ele começa com um simples gesto: parar.

Parar de tentar consertar o mundo. Parar de correr atrás de aprovação. Parar de se esconder atrás da utilidade.

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Até a próxima.

Confira os destaques da semana. 🌹

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